Passadas as eleições, a hora dos planos municipais de segurança
As eleições foram uma boa oportunidade para discutir o papel dos municípios na Segurança Pública. Agora é hora de planejar as ações.
Arthur Trindade Maranhão Costa*
No último domingo (15/11), os brasileiros foram às urnas escolher os novos prefeitos e vereadores dos quase 5600 municípios do país. Como das últimas vezes, as eleições transcorreram num clima de tranquilidade e a apuração dos votos aconteceu dentro da lisura de costume. Mais uma vez pudemos dizer que foi uma festa da democracia.
A segurança pública esteve entre os principais temas do debate eleitoral, o que não chega a ser uma novidade. Desde os anos 2000, os municípios vêm aumentando sua participação na segurança pública. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, entre 2002 e 2019 verificou-se um crescimento de 286% no total de gastos com segurança pública, que saltaram de cerca de R$ 1,7 bilhões para R$ 6,4 bilhões. Entretanto, a participação municipal varia significativamente de acordo com o estado.
O aumento da participação municipal se deveu a três fatores. Primeiro, houve uma mudança da percepção do eleitorado com relação a responsabilidade pela segurança pública. Até a década de 90, questões relativas à segurança pública eram tratadas essencialmente como responsabilidade dos governadores de estados. A partir da década de 2000 este quadro se alterou. E, com isso, passou-se a cobrar maiores investimentos em segurança pública, reforma nas estruturas das polícias e implantação de políticas públicas mais eficientes.
Segundo, houve uma forte indução do governo federal para que os governos municipais se engajassem mais no tema. A partir de 2002, o Fundo Nacional de Segurança Pública e, mais tarde, o PRONASCI, passaram a transferir recursos para aqueles municípios que contassem com estruturas administrativas voltadas para segurança pública. Esse dinheiro, em certa medida, acabou, considerando que a União tem reduzido suas despesas com segurança pública – ainda segundo o Anuário do FBSP, entre 2018 e 2019, a União reduziu em 3,8% o gasto com a área.
A principal resposta dos prefeitos foi a criação das guardas municipais. O crescimento das guardas foi significativo. Segundo a Munic/IBGE, entre 1980 e 2015, último ano com dados disponíveis, o número de guardas municipais cresceu de 120 para 1081. Onde já existiam guardas municipais foram contratados mais efetivos e adquiridos viaturas e equipamentos.
Mas não só. Um terceiro fator precisa de atenção. Com a estagnação dos investimentos estaduais na área e com a necessidade de dar respostas à população, muitas cidades optaram por criar programas de bonificação e pagamento de horas de trabalho dos policiais estaduais em suas folgas. Em outras palavras, muitas cidades aumentaram seus gastos aportando recursos para a manutenção e ampliação do policiamento em seus territórios. Não à toa, dos 5570 municípios existentes no país, 2423 declararam gastos com segurança pública em 2019.
Analisando as guardas municipais brasileiras, podemos distinguir pelo menos três funções desempenhadas por elas. Algumas seguem o modelo de guarda patrimonial. Estas guardas possuem atribuições bem delimitadas: defesa do patrimônio, do espaço público e proteção dos prédios municipais. Outras, atuam como se fossem polícias municipais. Estas guardas têm assumido as funções de policiamento ostensivo, substituindo as outras organizações policiais. Elas realizam o patrulhamento das ruas, buscando aplicar a lei aos comportamentos desviantes. Há também as guardas que atuam como força apaziguadora. Elas utilizam seu poder de polícia para administrar conflitos, prevenir crimes e solucionar problemas colocados pelo público. As atividades de repressão são raras e controladas.
Quanto à organização, embora os municípios tenham liberdade de estruturar suas guardas da forma que acharem conveniente, na prática eles seguem o modelo organizacional das polícias militares. Isso se deve aos processos de mimetismo aos quais estas organizações foram submetidas. Em muitos casos, os primeiros comandantes das guardas foram oficiais das polícias militares que acabaram por copiar as carreiras, os manuais e os protocolos utilizados pelas suas instituições de origem.
O papel dos municípios na segurança pública não se resume à criação das guardas municipais. Talvez a maior vocação dos municípios sejam as políticas de prevenção de violências. Alguns municípios desenvolveram políticas sociais de prevenção de violências muito bem-sucedidas. Especialmente onde estas iniciativas foram abrangentes e tiveram foco em áreas, grupos e situações de risco.
Mas, para implantar políticas abrangentes, foram elaborados planos estratégicos de segurança municipais, articulando as ações dos diversos órgãos e agências municipais, estaduais e até mesmo federais. Os planos também incluíam indicadores de acompanhamento e metas de desempenho, além de estabelecerem claramente as responsabilidades de cada um dos atores envolvidos na política pública.
Resumindo. Passada a festa da vitória, é hora de trabalhar e planejar as ações de segurança pública. Não basta contratar efetivos e comprar viaturas e equipamentos. É preciso elaborar planos estratégicos que definam claramente objetivos, metas e indicadores. Parabéns aos vencedores e boa sorte!
*Professor da UnB e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
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