Novas operações ambientais e em terras indígenas da Força Nacional de Segurança Pública caíram 50% em 2019; operações na Esplanada dos Ministérios chamam atenção

Alan Marques/Folhapress
Renato Sérgio de Lima

Levantamento preliminar feito pelo Faces da Violência junto ao Diário Oficial da União identificou que, em 2019, o Ministério da Justiça e da Segurança Pública autorizou, em 53 portarias, o emprego da Força Nacional de Segurança Pública em 34 novas ações e prorrogou a atuação da Força em outras 34 situações.

Consideradas apenas as novas ações, esse número é 26% menor daquele registrado em 2018, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (dados sobre operações ativas em 2018). Mas o que mais chama atenção não é a queda no número de operações, pois ela pode estar associada à queda de vários índices criminais e não é necessariamente uma má notícia.

O que chama atenção é o tipo de emprego da FNSP que está sendo feito pelo Governo Federal, que parece sobrecarregar os estados com atribuições federativas que deveriam ser de competência e financiadas pela União. Ao fazer uso de policiais cedidos pelas Unidades da Federação e não repassar recursos em níveis suficientes que ajudariam a pagar as despesas que os estados têm com tal cessão (o STF obrigou a liberação desses recursos apenas no final de 2019),  a União compromete uma iniciativa importante de cooperação federativa e compromete os estados em suas capacidades fiscais.

Das novas ações, 23% diziam respeito a operações de controle da manifestações ou distúrbios civis na Esplanada dos Ministérios e de apoio ao Ministério da Educação e outros Ministérios. Aqui, vale explicitar que a Polícia Militar do Distrito Federal, responsável pela Esplanada dos Ministérios, é uma das mais estruturadas e equipadas polícias do país, com recursos para cumprir esta função com excelência – e ela recebe recursos exclusivos do Fundo Constitucional até por proteger a sede da Federação.

Pelos custos envolvidos e pelas características de ser um consórcio federativo, não faz o menor sentido a utilização de policiais de outros estados cedidos para a FNSP para proteger prédios públicos em Brasília.  Mas é isso o que tem ocorrido, pois o emprego da PMDF depende, sempre, de conversas com o Governo do Distrito Federal e a União não gosta, historicamente, de pedir apoio mas apenas de dar apoio (com ela decidindo onde e como).

Para além da ação na Esplanada e o apoio aos Ministérios, de todas as novas ações autorizadas, só 20% foram de emprego direto na segurança e na manutenção da ordem pública nos estados, razão de ser que justificou a criação da Força em 2004.

Já 18% das ações da FNSP dizem respeito a ações em apoio projetos federais e/ou órgãos do Ministério da Justiça, como Polícia Federal, Rodoviária Federal ou Secretaria de Operações Integradas. Outros 15% ao projeto “Em Frente Brasil”, lançado no meio do ano e que focaliza ações em cinco municípios com altas taxas de homicídios dolosos.

Agora, chama bastante atenção e merece destaque as ações em apoio a órgãos como FUNAI, IBAMA ou Instituto Chico Mendes. Em 2019, tais ações responderam por 12% das operações da FNSP. Em 2018, ações ambientais e/ou em terras indígenas respondiam por 24% das operações da Força Nacional de Segurança Pública.

Ou seja, em 2019 há uma queda de 50% neste tipo de operação entre as novas ações autorizadas pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública (ao menos na declaração da razão da operação) – e, neste caso, não há números que comprovem a redução de conflitos ou de casos de violência que poderiam explicar esse movimento.  Há um alinhamento forte do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, que voltou a ser o responsável pela FUNAI, com a agenda ambiental e indígena do Governo como um todo.

 

 

Se excluirmos o apoio direto aos estados, em 2019, a Força Nacional foi empregada em 80% dos casos muito mais na lógica da intervenção e nos interesses da União e não na lógica da cooperação federativa e da pactuação de critérios objetivos de alocação de efetivos e definição de operações.

A Força Nacional de Segurança Pública é um consórcio de policiais de todas as Unidades da Federação (não é uma força policial autônoma) e é gerenciado pela União para ser utilizado em casos de emergências e crises. O que é prioridade e/ou o que deveria ser objeto da ação da Força Nacional deveria ser pactuado também com Governadores e Secretários de Segurança, que, no limite, pagam 81% das despesas com segurança pública no Brasil.

A segurança pública brasileira ainda tem muito a caminhar na direção da profissionalização e da modernização da arquitetura institucional da área. E, ganhamos muito mais se estruturarmos bons e transparentes mecanismos de monitoramento e avaliação das políticas públicas que nos ajudem a compreender e replicar o que de bom tem sido feito, independente de nomes ou de projetos de poder.

Um bom projeto para 2020 será renovarmos nossa crença na razão e tecnicamente explicarmos, sem pensamento mágico ou alquimias, o que tem contribuído para 2019 fechar com quedas tão expressivas em vários estados –  como no Ceará, que registrou uma redução de 50,1% nos Crimes Violentos Letais Intencionais e de 38,5% nas Mortes Decorrentes de Intervenção Policial. Ou no Espírito Santo, que reduziu em 11,8% os homicídios dolosos.