Segurança: um muro de arrimo para Moro chamar de seu
Como em política não existe vácuo e o combate a corrupção encontra-se no terreno minado das possíveis pedaladas jurídicas, o Ministro Sergio Moro tem atuado de forma intensa nas redes sociais para se apropriar da agenda da segurança pública e aproveitar a queda de alguns crimes violentos para fortalecer sua posição nas disputas de poder hoje em curso no país. Ele está em busca de uma nova marca.
Posição que, como já foi dito aqui no Faces da Violência, tem construído pontes com militares das Forças Armadas, sobretudo com os Generais Augusto Heleno e Villas Boas, para balancear a força do apoio das polícias militares diretamente ao Presidente Bolsonaro.
Antes uma agenda exclusiva do Presidente Jair Bolsonaro dentro do governo, a segurança pública tornou-se o muro de arrimo de Moro, que tem buscado apresentar várias ações pontuais de sua gestão, de governos locais e das polícias estaduais como “prova” de que a causa da redução é a sua atuação à frente da pasta da Justiça e da Segurança Pública.
Mas, uma análise objetiva dos acontecimentos, não autoriza ninguém a dar crédito à uma narrativa política exagerada e que, em termos práticos, não é de todo verdadeira. Isso não significa que não tenhamos a obrigação de identificar ações das polícias na gestão Moro que parecem surtir efeitos e que deveriam ser mais bem estudadas e avaliadas (para serem replicadas, se for o caso).
Moro parece afetado pela ansiedade e pela vontade de hegemonia que recorrentemente tomam conta dos políticos. Mas segurança não é improviso ou pode ser gerida do faroeste das redes sociais. Se assim fosse, hoje tudo mil maravilhas, mas ao menor sinal de problemas, tudo o que é sólido desmancharia no ar – com o agravante de a culpa recair sempre nos policiais e nos outros, nunca no político.
Na segurança pública, Sergio Moro esta tendo uma atuação muito parecida com Dilma Roussef, que de seu palácio em Brasília olhava o mundo como se tudo soubesse e se de ninguém ou do Parlamento precisasse, sem notar que a sociedade em movimento não segue um destino inexorável. A política serve para construir consensos e não para impor a vontade daquele que conjunturalmente pareça mais forte.
Em termos concretos, ações integradas entre Polícias Federal e Rodoviária Federal e estaduais; envio de policiais mobilizados pela Força Nacional; criação de Centros Integrados e Comando e Controle (com várias marcas e nomes), Planos Pilotos (Em Frente Brasil, Pronasci, GGIs Municipais, etc), SINESP (criado em 2012) são ações e programas importantes e que o Ministério da Justiça e da Segurança Pública teve a sabedoria de mantê-los e, em alguns casos, ampliá-los. Parabéns!
Porém, não há nenhuma inovação política ou institucional. Eles são o aprimoramento positivo de projetos, na medida em que políticas públicas de segurança não devem ficar à mercê das vontade do dirigente de plantão. Até por isso, muitas dessas importantes ações estão sendo feitas pelo comprometimento de governadores, prefeitos, secretários e policiais, vários de Unidades da Federação governadas por partidos de oposição. E sem o repasse de recursos, já que quase não há dinheiro para cooperação federativa.
A queda da violência no Brasil não é responsabilidade de Moro ou Bolsonaro e precisa ser vista em perspectiva. Ela é devida, em grande medida, a dinâmicas locais e não há estudos fidedignos que estabeleçam relações de causa e efeito entre o que Moro tem feito e a tendência dos homicídios. Se algum fator nacional se fez presente, esse fator são as polícias, porém cujas normas não foram mudadas pela atual gestão e continuam informadas por leis anteriores à nossa Constituição.
O gráfico abaixo (atualizado às 21:07 para incluir as legendas) mostra que a queda da violência letal teve início muito antes de Bolsonaro e Sergio Moro e que o comportamento das linhas de tendência por médias móveis não indicam nenhum fator preponderante que tenha acentuado a curva após a posse do atual governo. Ao contrário, a tendência dos sete primeiros meses deste ano é similar ao mesmo período de 2018 (retângulos em destaque). E mesmo em 2017, a queda ocorreu em vários momentos.
Mantidas as condições de 2018, a projeção no gráfico mostra que a violência continuará caindo. Ou seja, o que está provocando a queda está associado às políticas públicas, mas não é exclusivamente pautado/causado por elas. Temos que investir em programas de monitoramento e avaliação que nos digam, de fato, quais as variáveis em jogo. O esforço por vender a ideia de que a violência é fruto exclusivo da gestão Bolsonaro é, em essência, um mero recurso retórico.
Se fosse verdade que a queda dos homicídios é devida ao novo governo federal, teríamos um incremento na tendência da queda desde janeiro e não um comportamento similar. O MJSP tem equipes de excelência no tratamento estatístico de dados que poderiam auxiliar na formatação de um discurso político mais aderente à realidade e, por conseguinte, mais potente.
No máximo, podemos dizer que as medidas desastradas na área da regulação das armas de fogo e munições ainda não surtiram efeitos e não estão atrapalhando (ou ajudando, antes que alguns achem isso). Mesmo algumas das ações de Bolsonaro que parecem ser a mais fortes candidatas a estarem associadas à queda dos homicídios, como a transferência de lideranças de facções e a maior disposição da PF em ir atrás do dinheiro do tráfico de armas e de drogas, são ações que ganharam fôlego nesta gestão, mas não começaram hoje.
É claro que o Governo pode e deve comemorar; pode e deve explicitar que continua políticas de Estado que estão dando resultados e investe em identificar todas as variáveis em jogo. E, se for o caso, inova. Todavia, a incapacidade de diálogo e a necessidade de criar contrapontos o tempo todo para manter a polarização que o levou ao poder estão boicotando a ambiência política e institucional.
Basta ver o impacto da Campanha em defesa do Pacote Anticrime, que gerou um enorme desconforto na Câmara dos Deputados e teve por objetivo acuar os deputados, como o próprio Deputado Rodrigo Maia disse para a Folha de S.Paulo.
Não há escusas eticamente válidas para nos perdermos nos discursos vazios e não garantir que a epidemia de violência seja efetivamente banida da vida social brasileira.