Faces da Violência https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br O que está por trás dos números da segurança pública Tue, 23 Nov 2021 18:56:47 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Tecnologia como instrumento de compliance em segurança pública https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br/2019/02/07/tecnologia-como-instrumento-de-compliance-em-seguranca-publica/ https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br/2019/02/07/tecnologia-como-instrumento-de-compliance-em-seguranca-publica/#respond Thu, 07 Feb 2019 11:20:02 +0000 https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/02/c1907201001-150x150.jpg https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br/?p=606 Na ideia de destacar a importância de uma nova governança do sistema de segurança pública e justiça criminal como fator de transformação da realidade de medo, crime e violência do Brasil, o Faces da Violência abre espaço para uma reflexão sobre o papel da tecnologia na estruturação de regras de compliance e de integração de ações, passo primeiro e essencial para a maior efetividade das políticas criminais e penitenciárias do país.

Por Alfredo Deak Junior

O termo “Compliance”, do verbo em Inglês “to comply”, que significa agir conforme as regras, a muito se destaca nas grandes organizações como a principal ferramenta de controle e garantia da prestação de serviços de maneira transparente e ética. Na administração pública cada vez mais os princípios constitucionais da impessoalidade, moralidade e transparência são requeridos pelo cidadão para que todas as ações de governo sejam republicanas e voltadas para o bem social, portanto compliance passa a ser uma matéria transversal imprescindível para o sucesso de qualquer serviço público.

Na obra “Arquitetura de TI como Estratégia Empresarial”, de 2008, os autores Ross, Weill e Robertson, dizem que as empresas mais lucrativas desenvolvem um alicerce de execução de suas operações, com base na digitalização de seus processos centrais – “Compreendemos desde então que a arquitetura empresarial se resume a estes dois conceitos: a integração e a padronização dos processos de negócios. Em suma, a arquitetura empresarial não é uma questão de TI – é uma questão de negócios”.

Os mesmos autores ainda entendem que o diferencial que leva uma empresa ao sucesso é a inovação, porém lastreada por uma base estável pela digitalização de seus processos centrais, embutindo-os em um alicerce para a execução operacional e complementam “Bons funcionários é que projetam o modelo operacional, constroem o alicerce, executam e inovam”.

Atualmente a “Transformação Digital” das organizações é a grande referência no uso de tecnologia autônoma, que inverte o paradigma de digitalizar os processos de negócios pelo uso da tecnologia, para a criação de negócios com base no uso da tecnologia. Casos disruptivos como Uber, AirBnB, Alibaba demonstram que a inovação nasce da tecnologia para criar uma empresa e não o contrário.

Na década de 1990 programas importantes do Governo do Estado de São Paulo como a ‘Gestão pela qualidade’, iniciada pelo Comitê Estadual de Gestão Pública, imediatamente adotado pela Polícia Militar em seus prêmios internos de Gestão pela Qualidade em conjunto com atividades inovadoras como o Programa de Rádiopatrulhamento Padrão, e que se tornaram no alicerce de uma geração que evoluiu dos modelos empíricos de gestão operacional policial, para modelos cuja base é a análise de dados e a exploração do conhecimento, iniciando a fase da Inteligência Policial.

O emprego da Inteligência Policial no Estado de São Paulo, amadurecidos na década de 2000, principalmente pela Polícia Militar, inaugura uma nova geração de normas internas como Procedimentos Administrativos Padrão, Procedimentos Operacionais Padrão, Matriz de Distribuição de Recursos, Programas de Policiamento, PROCIC (que inaugurou conceitos importantes de indicadores criminais, operacionais e sociais); entre dezenas de outros, que como base herdaram os temas de Qualidade Total e Direitos Humanos como disciplinas transversais de uma polícia de proteção da vida e do cidadão no lugar da prioridade para combater o criminoso.

A iniciativa do uso da Inteligência sobre a Força, gerou consistência e confiabilidade na atividade de gestão da Instituição, transformando-se em um dos principais programas de governo, aclamado como um dos fatores mais relevantes para a redução dos índices de criminalidade em São Paulo.

Naquele momento o problema a ser tratado era como a falta de padrões, a fraca integração de dados e a pluralidade de modelos e de sistemas de gestão, impediam a melhoria contínua e a modernização das Instituições pelo desenvolvimento de sistemas corporativos em detrimento dos padrões setoriais. Iniciou-se com sucesso programas de padronização de infraestrutura, como a rede Intragov integrando todos os Órgãos da Administração Pública numa única rede de dados; a Rede Executiva com a integração de todos os Agentes Públicos num único sistema de comunicação e colaboração; publicação da Resolução 160 para unificação dos modelos estatísticos e padronização de fontes de dados criminais e operacionais; além de implementar a unificação de áreas de atuação entre Polícia Militar, Civil e Técnico-Científica.

Sistemas informatizados como o INFOCRIM democratizaram o uso do conhecimento criminal nas dimensões espacial, quantitativa e qualitativa, permitindo a proliferação dos Analistas Criminais que passaram a ter protagonismo no desenvolvimento de estratégias de prevenção e investigação em todas as unidades policiais do Estado, deixando de depender de estruturas engessadas que até aquele momento centralizavam o conhecimento e a definição de estratégias.

O INFOCRIM também inaugura o primeiro modelo de compliance com suporte de TI em Polícia, onde para seu sucesso instrumentos foram criados para garantir que normas como a Res 160 fossem seguidas, permitindo que Polícia Militar e Polícia Civil, passassem a desenvolver análise de dados de maneira setorial e conjunta, em sua pequena área de atuação; e, consequentemente planejando ações com dados idênticos e colaborativos. Modelos importantes de auditoria na qualidade de dados, realizadas de maneira cega, garantiram a fidelidade dos dados como local de crime, classificação criminal, descrição clara de modus-operandi, registro fiel de envolvidos e objetos apreendidos.

O resultado do INFOCRIM inicia um novo modelo de Gestão com reuniões conjuntas das Polícias Militar e Civil, com planejamento prévio, seguidas de reuniões com os Delegados Seccionais e Comandantes de Área de Policiamento; e, finalmente consolidadas nas reuniões de todos com o Secretário de Segurança, garantindo que todo o processo fosse público e homogêneo, seguindo doutrina específica para o controle e gestão de segurança pública em todas as cidades do Estado.

Os Terminais Móveis de Dados (tablet ou smartphone) trazem uma nova dinâmica ao Policiamento, pois além da governança pela rastreabilidade de cada recurso policial, também atuam como fonte de conhecimento empoderando o agente policial. Como exemplo, as ligações da última hora no 190 geram estatísticas em tempo real e trazem ao policial militar as ruas com maior demanda de atitude suspeita, conectando de maneira inovadora o cidadão ao policial; da mesma forma entregam a capacidade de informar às Prefeituras de pontos de alerta sobre segurança primária, como iluminação, lombadas clandestinas, bloqueios em rua, lixo acumulado, que acaba por aproximar a polícia dos agentes administrativos.

Por fim as tecnologias inteligentes geram pelo seu próprio uso, controles naturais, sem que se aumente a carga de trabalho, possibilitando que indicadores de controles sejam coletados e associados outros indicadores criminais, respeitando e se limitando às normas e métodos de trabalho, possibilitando a geração de alarmes de gestão para empoderar o policial com conhecimento para aumentar sua consciência no terreno e sua produtividade, gerando também instrumentos de gestão automatizados para todos os níveis de comando hierárquico e operacionai, garantindo a transparência das ações e o cumprimento ético da atribuição policial.

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Alfredo Deak Júnior. Coronel Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo, atualmente exerce a função de Diretor de Justiça e Segurança Pública da Microsoft América Latina. Atuou na área de Tecnologia da Informação da Polícia Militar desde 1986, dedicado ao desenvolvimento de softwares especialistas em Inteligência Policial. Pós-graduado em Análise de Sistemas pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo e em Administração de Sistemas de Informação pela Universidade Mackenzie. E-mail: alfredo@deak.com.br.

Referências:
ROSS, Jeanne W.; WEILL, Peter; ROBERTSON, David C. Arquitetura de TI como Estratégia Empresarial. São Paulo: M. Books, 2008. WEILL, Peter; ROSS, Jeanne W. Governança de TI – Tecnologia da Informação. São Paulo: M. Books, 2006.

Notas do Blog:
1 – Para uma história da política de segurança pública em São Paulo, veja: http://fbsp.memoriaseguranca.org.br/.
2 – Além de São Paulo, vários outros estados também têm inovado na aplicação de novas tecnologia e modelos de análise, como Santa Catarina e/ou Ceará, que serão oportunamente detalhadas neste espaço.

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